“Obrigado, Tebas, por superar todos os obstáculos para estabelecer o plano para um futuro melhor!”. Com esse reconhecimento, o Doodle do Google amanheceu nesta terça-feira (30/06) estampando a figura de Joaquim Pinto de Oliveira. Tebas, como era conhecido, foi responsável pela reforma completa da primeira torre original da antiga Catedral de São Paulo (1778), demolida em 1911, e por tantos outros projetos emblemáticos da arquitetura paulistana colonial.
Escravizado até os 57 anos, quando conseguiu sua alforria, prestou enorme contribuição à arquitetura de São Paulo, em obras como a ornamentação da antiga igreja do Mosteiro de São Bento e a construção de outros edifícios religiosos, como a Igreja da Ordem Terceira do Carmo e a Igreja das Chagas do Seráfico Pai São Francisco. Mas só teve seu legado prestigiado mais de 200 anos após suas morte. Foi em 2018 que o Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas no Estado de São Paulo (SASP), na gestão de Maurílio Chiaretti, reconheceu Tebas como arquiteto e urbanista de fato e o colocou no quadro associativo permanente da entidade. “Esse foi um grande marco na história recente das entidades de arquitetos e urbanistas. A sua importância tomou escala global ao ser tão divulgada pelos veículos de comunicação em massa, levando ao grande público fatos históricos de um profissional que já foi tido como lenda”, afirma. Para Chiaretti, que esteve à frente do SASP na época, a homenagem revigorou a discussão dos limites da profissão dos arquitetos e urbanistas e das feridas ainda abertas do período escravocrata. “Não é apenas o reconhecimento da arte de mais um arquiteto, mas é, antes de tudo, a valorização do trabalhador que sob duras penas edificou obras que se perpetuam e contam uma parte da história paulistana”, reforça o presidente do SASP, Marco Antonio Teixeira da Silva.
Nascido em Santos (SP) em 1721 e falecido em 1811, aos 90 anos, o arquiteto e urbanista teve sua história resgatada recentemente no livro “Tebas: Um Negro Arquiteto na São Paulo Escravocrata“, lançado em 2019 pelo jornalista Abilio Ferreira e por Carlos Gutierrez Cerqueira, Emma Young, Ramatis Jacino e Maurílio Chiaretti. A obra relata que Tebas chegou na capital paulista como escravo do arquiteto e construtor português Bento de Oliveira Lima. Dos 58 anos até sua morte, deixou sua marca na cidade, que na época era essencialmente erguida com taipas, construções de barro e estética bastante limitada. Especialista na arte e na técnica de talhar e aparelhar pedras, Tebas impactou de forma decisiva na arquitetura de São Paulo, onde era requisitado principalmente para construções de ordens religiosas, tendo sido responsável por diferentes ornamentações de igrejas. Soma-se ao seu legado, ainda, a construção do primeiro chafariz público da capital paulista, o Chafariz da Misericórdia, localizado onde hoje existe a rua Direita. A peça, no entanto, não se encontra mais no local desde 1886 em função do processo de canalização de água na cidade.
Na esteira do reconhecimento de Tebas como arquiteto e urbanista, o SASP vem dando continuidade a ações desta magnitude por meio de parcerias com diversas organizações e pesquisadores. A proposta é apoiar a viabilização do Memorial dos Aflitos, próximo à Capela dos Aflitos (bairro da Liberdade). A região foi gueto dos negros escravizados antes da chegada dos japoneses e, recentemente, local onde foram encontradas ossadas de escravos em uma obra. O canteiro foi embargado e transformou-se em um importante sítio arqueológico do Brasil. “São vários tecidos que recobrem a história da nossa formação social que foram tampados por concreto e pelas mais atuais apropriações culturais. Toda essa história precisa respirar e conviver junto com a dos demais povos no bairro que carrega o nome de uma luta comum: a Liberdade. Quantos Tebas ainda precisam ser reconhecidos para corrigirmos os males do passado? Quantos e quantas Tebas estariam atuando hoje no Brasil sem poder carregar o título de arquiteto (a) e urbanista?”, questiona Chiaretti.
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